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segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Liberação de transgênicos na mira do Ministério Público

Fontes do setor agrícola temem que ativistas se unam para lotar as audiências do MPF

Está instalada uma disputa no processo de autorização para a venda de sementes transgênicas no Brasil. O impasse pode atrasar ou até mesmo impedir liberações comerciais de novas tecnologias desenvolvidas por grandes multinacionais como a Dow AgroSciences, DuPont do Brasil e Monsanto.

Até pouco tempo, apenas uma voz ativa dava as cartas na regulamentação do setor. Agora, no entanto, o mercado de transgênicos passa a ter no Ministério Público Federal (MPF) do Distrito Federal um local de questionamento das autorizações de comercialização de organismos geneticamente modificados (OGM) concedidas pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CNTBio).

O MPF está se colocando contra o método atual de análise do colegiado. No mês passado, recomendou à CTNBio, por meio de um ofício, a suspensão das liberações comerciais de sementes transgênicas até que fosse garantida "a participação da sociedade civil nas decisões" do órgão.

A pedido do autor do ofício, o procurador da República Anselmo Henrique Cordeiro Lopes, o documento foi transformado em inquérito civil, "a fim de investigar possível ilegalidade na liberação comercial, pela CTNBio, de sementes de soja e milho geneticamente modificados que apresentam tolerância aos agrotóxicos 2,4-D, glifosato, glufosinato de amônio DAS-68416-4, glufosinato de amônio DAS-44406-6 e outros herbicidas".

Se as liberações com os produtos especificados forem proibidas, a Dow AgroSciences e a Monsanto serão as empresas mais prejudicadas. A primeira tem quatro dos cinco processos esperando a liberação da CTNBio com tecnologias resistentes aos produtos citados pelo procurador. A Monsanto tem apenas um processo de milho na fila de liberação, que inclui resistência ao glufosinato de amônio.

O foco principal de disputa está em torno do uso em grande escala do 2,4-D - ingrediente do "agente laranja", desfolhante usado pelo exército americano na Guerra do Vietnã. O pedido, feito pela Dow AgroSciences, encontra resistências de ambientalistas. A empresa alega que a fórmula do produto é diferente da usada no passado e está menos tóxica.

Em sua última reunião, no dia 17 de outubro, a CTNBio indeferiu o pedido feito por Lopes. Com isso, a disputa teve início. O procurador informou que irá realizar audiências públicas por conta própria para avaliar a percepção da população sobre o tema em paralelo à comissão. Caso as informações colhidas sejam contrárias ao que for aprovado na CNTBio, o MPF pode pedir a anulação da autorização dada.

Fontes do setor agrícola temem que ativistas contrários aos transgênicos se unam para lotar as audiências públicas do MPF e "atrapalhar" o andamento da liberação de novas tecnologias OGM no país.

O pedido do MPF se amparou em um relatório do Grupo de Estudos de Agrobiodiversidade do Ministério do Desenvolvimento Agrário (GEA/MDA). O grupo afirmou que a liberação de organismos geneticamente modificados (OGMs) resistentes a defensivos agrícolas funciona como fator multiplicador do consumo de agrotóxico no Brasil.

Segundo o MP, a questão é "complexa" e os riscos precisam ser debatidos com a sociedade e o meio acadêmico. Lopes disse que a liberação comercial desses OGMs só é aceitável após uma avaliação aprofundada sobre os impactos diretos e indiretos que esse incentivo ao uso de agrotóxicos pode gerar no meio ambiente e no consumo humano.

De acordo com o presidente da Aprosoja Brasil, Glauber Silveira, que representa os produtores do grão, o MPF está se "intrometendo" no assunto. "O MPF não é um órgão técnico. Ele deveria fiscalizar as normas, procedimentos, processos legais e técnicos. O que ele quer hoje é avaliar as discussões técnicas que são tomadas por especialistas da área", disse.

"O MPF alega que a liberação vai efetivar o uso de defensivos agrícolas, mas é o contrário, pois o transgênico diminui o uso de defensivos. Alguém vai dizer que a tecnologia BT [contra lagartas] veio para aumentar o uso de defensivos?", emendou Silveira.

A reportagem é de Tarso Veloso e publicada pelo jornal Valor, 28-10-2013.
Instituto Humanitas Unisinos

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