26/04/2014 | domtotal.com
Shakespeare e nosso complexo de vira-latas
O brasileiro médio morre de complexo de vira-latas, tem vergonha de si e de sua língua.
Por Érico Nogueira*
Na última quinta-feira, 24, comemoraram-se os 450 anos de nascimento do poeta William Shakespeare, uma das glórias da poesia ocidental de todas as épocas, lugares e estilos. Apareceu na TV, deu no jornal etc., e era justo que assim fosse. O que não é justo, e é a mais pura manifestação de nosso atávico complexo de vira-latas em sua modalidade literária, é não dispensar as mesmas honras a um Camões, a um Antônio Vieira, a um Guimarães Rosa, quando surge a ocasião de fazê-lo. Senão vejamos.
O adjetivo latino classicus, de que deriva o português “clássico”, significa sobretudo “de primeira ordem ou grandeza”. Desse modo, o escritor clássico nada mais é que o escritor de primeira classe, considerado modelo de língua e dependente, no que diz respeito à sua fama, de um sistema educacional que o coloca no centro do ensino. Foi assim com Homero na Grécia; com Virgílio em Roma; com Dante na Itália; com Cervantes na Espanha; e com Shakespeare na Inglaterra e colônias.
Pois bem: a despeito de todas as guerras e revoluções de toda a ordem que viraram o mundo pelo avesso e o desviraram sei lá quantas vezes, Dante, Cervantes e Shakespeare continuaram a ocupar, em seus países e línguas de origem, o lugar que justamente lhes cabe no ensino de suas respectivas línguas e literaturas.
E então chegamos a Portugal — onde, já no séc. XVIII, o poeta Filinto Elísio reclamava dos “francesistas” que negligenciavam os bons clássicos portugueses em favor dos franceses. O mesmo se aplica ao Brasil de hoje e seus cretinos “anglicistas” que arrotam uma fatia de Shakespeare com uma pitada de Joyce sem degustar o lauto banquete de nossos melhores autores.
Some-se a isso a omnipresença da língua inglesa, e o tino comercial dos americanos, que vendem o seu como o melhor peixe das galáxias, e tem-se o fenômeno William Shakespeare, autor “insuperável”, “o maior de todos” & outras baboseiras que ouvi e li ontem na TV e nos jornais.
O brasileiro médio morre de complexo de vira-latas, tem vergonha de si e de sua língua, e não conhece o que tem de melhor. Shakespeare é maravilhoso, sim. Mas muito de sua fama é sistema educacional sólido e propaganda pra vender livro. Que tal copiarmos o método, e vendermos Machado e Pessoa?
Fui!
Na última quinta-feira, 24, comemoraram-se os 450 anos de nascimento do poeta William Shakespeare, uma das glórias da poesia ocidental de todas as épocas, lugares e estilos. Apareceu na TV, deu no jornal etc., e era justo que assim fosse. O que não é justo, e é a mais pura manifestação de nosso atávico complexo de vira-latas em sua modalidade literária, é não dispensar as mesmas honras a um Camões, a um Antônio Vieira, a um Guimarães Rosa, quando surge a ocasião de fazê-lo. Senão vejamos.
O adjetivo latino classicus, de que deriva o português “clássico”, significa sobretudo “de primeira ordem ou grandeza”. Desse modo, o escritor clássico nada mais é que o escritor de primeira classe, considerado modelo de língua e dependente, no que diz respeito à sua fama, de um sistema educacional que o coloca no centro do ensino. Foi assim com Homero na Grécia; com Virgílio em Roma; com Dante na Itália; com Cervantes na Espanha; e com Shakespeare na Inglaterra e colônias.
Pois bem: a despeito de todas as guerras e revoluções de toda a ordem que viraram o mundo pelo avesso e o desviraram sei lá quantas vezes, Dante, Cervantes e Shakespeare continuaram a ocupar, em seus países e línguas de origem, o lugar que justamente lhes cabe no ensino de suas respectivas línguas e literaturas.
E então chegamos a Portugal — onde, já no séc. XVIII, o poeta Filinto Elísio reclamava dos “francesistas” que negligenciavam os bons clássicos portugueses em favor dos franceses. O mesmo se aplica ao Brasil de hoje e seus cretinos “anglicistas” que arrotam uma fatia de Shakespeare com uma pitada de Joyce sem degustar o lauto banquete de nossos melhores autores.
Some-se a isso a omnipresença da língua inglesa, e o tino comercial dos americanos, que vendem o seu como o melhor peixe das galáxias, e tem-se o fenômeno William Shakespeare, autor “insuperável”, “o maior de todos” & outras baboseiras que ouvi e li ontem na TV e nos jornais.
O brasileiro médio morre de complexo de vira-latas, tem vergonha de si e de sua língua, e não conhece o que tem de melhor. Shakespeare é maravilhoso, sim. Mas muito de sua fama é sistema educacional sólido e propaganda pra vender livro. Que tal copiarmos o método, e vendermos Machado e Pessoa?
Fui!
*Érico Nogueira é poeta, tradutor e professor de língua e literatura latinas na Universidade Federal de São Paulo.
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