'Uma Noite de Crime' faz retrato sangrento dos EUA
Cena de "Uma noite no crime": crítica à violência.
Por Alysson Oliveira
São Paulo - Reality shows usam um princípio que fascina perversamente desde a antiguidade: o sacrifício alheio. Basta lembrar as peças e mitos do passado, até chegar ao presente, na televisão, cinema e literatura, de "Big Brother" a "Jogos Vorazes" e afins.
O suspense futurista "Uma Noite de Crime" parte do mesmo princípio do prazer maligno em ver os outros sofrendo, sendo humilhados e, finalmente, morrendo. O ano é 2022 e o mundo se tornou um pesadelo distópico. Durante uma noite todos os anos, todo tipo de crime é permitido sem qualquer restrição.
James Sandin (Ethan Hawke) é um funcionário e pai exemplar, casado com Mary (Lena Headey), com quem tem um casal de filhos, Charlie (Max Burkholder) e Zoey (Adelaide Kane). Quando o jogo começa, ele protege sua casa, cobrindo janelas e portas, certificando-se de que ninguém entre, transformando o local numa verdadeira prisão.
Para que esse cenário de uma noite de crime possa existir, os Estados Unidos voltaram novamente a ser um país próspero, onde o desemprego não passa de 1 por cento. Nessa noite, quando os homens de bem podem liberar seus demônios, nem a polícia nem os médicos interferem. Ninguém será julgado pelo que cometeu, e assim, podem viver felizes e sem culpas nos outros 364 dias e meio do ano.
James DeMonaco, que escreve e dirige o filme, tem algo a dizer sobre o mundo contemporâneo. "Uma Noite de Crime" é uma sátira, e, como tal, depende de referenciais que estão nos Estados Unidos de hoje.
Obviamente, o filme não fala do futuro, mas opera numa chave que permite ler o presente e aponta o dedo: há algo de errado nessa sociedade. Embora tal afirmação esteja longe de ser novidade ou se aplicar apenas aos EUA, é sintomático, por exemplo, que o personagem central trabalhe numa empresa de segurança e as casas tenham se transformado em verdadeiras fortalezas.
Quando os Sandin se isolam e se protegem em sua casa, percebem que não estão sozinhos, nem dentro, nem fora, onde uma multidão enfurecida pede que um deles seja jogado para fora. DeMonaco não é Michael Haneke, e "Uma Noite de Crime" não é "Funny Games - Violência Gratuita".
Por isso, ele vai para caminhos mais explícitos, desarmando, aos poucos o clima de horror e estranhamento que construiu com esforço. O sangue se torna banal e mancha a tela mais do que o necessário. O comentário social que pretendia estampar no filme acaba se perdendo em mais uma história em que poças de sangue ditam as regras.
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Reuters
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